Sol em gêmeos

Foi impossível ver a chuva de meteoros de madrugada porque choveu. Choveu água, para não ficar confusa a frase, nublando o céu. Benéfica chuva para aplacar a secura de final de outono que traz fumaças e doenças respiratórias. Olhar o céu à noite é atividade rara, ainda mais em centros urbanos cobertos pela poluição luminosa. Há um mundo acima dos olhos invisível para os conviventes com concreto, asfalto, edifícios e monumentos à materialidade da civilização. Paradoxalmente, a contemplação de estrelas é uma viagem ao passado, distantes a muitos milhares ou milhões de anos-luz que estão, cuja luminosidade vaga pelo espaço há um tempo de igual grandeza. O sol já vai nascendo cada vez mais ao norte, fruto da inclinação do globo terrestre em seu trajeto ao redor da estrela. Sabiam disso os povos da antiguidade que atribuíram tal deslocamento a estrelas próximas que formam constelações artificialmente desenhadas pela associação com imagens que conheciam. Assim, a virada do mês na astrologia continua a enaltecer os geminianos e lá vamos nós novamente comemorar aniversário junto com o dia do meio ambiente.

Tal qual a partir da astrologia iniciou-se a ciência astronômica, outras religiões e crenças deram origem à base cultural e quiçá social em que vivemos. Escritos religiosos e míticos me interessam como documentos históricos e culturais que são. Constituem uma ficção tão forte que se torna realidade para muitos. Não discuto e respeito. Quando tais documentos são mesclados com o direito, junções inusitadas acontecem. O Vaticano acaba de promulgar uma nova constituição e tenho lido opiniões a respeito, em particular a do advogado Edson Luiz Sampel, que escreveu um arrazoado na Folha de S. Paulo intitulado "Uma revolução na Igreja Católica". Repito: longe de mim qualquer discussão no âmbito de crenças. Mas dali veio-me a constatação de que o Brasil é o único país do mundo com seis tipos de Justiça: comum, trabalhista, militar, eleitoral, desportiva e, vemos pelo artigo, eclesiástica. Importante a atualização religiosa que o advogado apresenta. Pena que tal revolução não inclua a participação política consciente dos fiéis, não votando em representantes que pregam o ódio, a morte e a violação de todos os direitos e princípios humanos.

O sol dos antigos é o mesmo que propicia o advento e o avanço da energia fotovoltaica, com preços reduzidos que a fazem competir, agora, com outras formas de obter energia elétrica. É ela - a eletricidade - que move motores, transforma-se em calor nas resistências e acenderá lâmpadas, as mesmas que também contribuem para a poluição luminosa que impede vermos outras luzes bem mais distantes. Energia e massa formam o universo, mas também tempo e espaço entram na equação. Tudo culminando no que chamamos evolução cósmica. O termo é bonito, mas contém certo misticismo perigoso que, quando usado pelos onipresentes charlatães, vira pseudo-ciência para enganar uma boiada de desavisados, ou agregar outro conjunto também grande conduzido pela má fé. O mencionado novo espaço para a necessária divulgação científica em jornal da região de Campinas, na postagem da semana passada, ainda não aconteceu, restando os demais para combater as dissimulações reinantes (https://www.brasil247.com/blog/dissimulacoes), políticas na essência. #IniCiencias

Comentários

  1. Caro Adilson: um texto importante, escrito com categoria, numa forma gostosa de ler e até senti um pouco de "poesia" no ar, o que não é novidade em se tratando de um poeta-trovador, entrelaçando seus parágrafos, com importantes temas.
    Maria Felim

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  2. Sabe Adilson?! Sempre fico pensando a mesma coisa: quando será que algumas pessoas tomarão consciência de que "há um mundo acima dos olhos invisível para os conviventes com concreto, asfalto, edifícios e monumentos à materialidade da civilização", citado por você? Quando as pessoas entenderão de que tudo faz parte de uma cadeia cósmica e que nós, como seres humanos, devemos minimamente preservar e respeitar o planeta em que vivemos? Tomara que a energia boa prevaleça e possamos ter fé no futuro.

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  3. Como já disse Oscar Wilde, estamos todos na sargenta, mas tem alguns olhando as estrelas.

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  4. Vamos olhar as estrelas !

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  5. Eliana França Leme3 de junho de 2022 às 10:49

    Seus textos são sempre muito bons, Adilson. Dá gosto de lê-los. Expõe suas ideias com sutileza e com a delicadeza de um poeta. Parabéns!

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