Outras formas de poder

Dada a diferença de formação e aprendizado fônico, falantes nativos de espanhol têm dificuldade de diferenciar a pronúncia de nossas vogais abertas e fechadas. As palavras poço e posso são exemplos. O que para nós contém evidente diferença, constituindo-se palavras heterógrafas e heterófonas, para os vizinhos da América Latina não há essa distinção. Se não posso ir a fundo, vou ao fundo do poço. Uma frase irônica como trava língua é hostil na compreensão de nossa incapacidade de convivência pacífica em sociedade. Nem adentraremos a histórica incompreensão de sons idênticos transcritos com distintas letras. E vice-versa. A expressão 'fundo do poço' perdeu o sentido da esperança nela contida, pois já não há limites para a degradação social, pessoal e política, qualquer que seja a entonação que demos à pronúncia. O pior sempre piora.

O poder indígena é traduzido de outras formas, ao menos entre as comunidades com que temos acesso e informação. Em discussão com especialistas, há relatos de representantes desses povos que não conseguiam entender como pode haver em uma sociedade estoque de alimentos concomitante a pessoas passando fome. Na questão abordada na Flip na postagem de semana passada (http://adilson3paragrafos.blogspot.com/2020/12/perder-e-aprender.html) e perguntada pelo meu leitor do blog, o professor José Lunazzi, a religiosidade foi ali pouco citada ou apresentada. A minha intervenção foi para a escritora brasileira Márcia Kambeba fazer um comentário sobre a questão de se estabelecer uma política dos povos originários, não apenas para a proteção deles, mas para a proteção de todos nós e de toda nossa cultura. A apresentação pode ser vista no Youtube (https://www.youtube.com/watch?v=HJDT2XRlaEc) e minha pergunta pode ser vista após 1h11min20seg. Foi a última resposta dada pela indígena, reforçando que a política de sobrevivência sempre foi feita e que a contribuição para outros povos (todos nós) existe e é importante. Vale a pena assistir à entrevista completa, ainda que ela não tenha respondido integralmente o que eu pensara em minha pergunta. Diálogo é uma forma de poder também a ser praticada.

Acompanhei a última sessão legislativa do Senado Federal nesta terça-feira, 15 de dezembro, coincidente com os 30 anos em que mudei meu estado civil. Nas palavras de uma senadora, houve tratoradas para a aprovação das diretrizes orçamentárias e outras matérias que não passaram por todas as comissões, em função de interesses e das limitações da pandemia, com muitas atividades remotas. Por outro lado, uma corrente entabulou homenagens ao presidente daquela Casa que se despede do cargo, uma vez que o Supremo Tribunal Federal confirmou a clareza óbvia do texto constitucional que proíbe a reeleição dos membros da Mesa, incluindo a presidência. Votações marcantes foram a rejeição da indicação para a embaixada em Genebra, na Suíça, vinculada à ONU, e a aprovação da autorização de venda de terras brasileiras a estrangeiros. De um lado, um recado à ala 'idiotológica' do governo federal, que prioriza uma estapafúrdia, anacrônica e retrógrada pauta de costumes para lidar com assuntos internacionais. Mas, de outro, a perda da soberania nacional, que pode acontecer com a ocupação das terras agricultáveis por estrangeiros, contrasta com o discurso militar-ufanista. A Câmara dos Deputados ainda analisará o projeto de lei, mas as perspectivas não são muito boas.

Comentários

  1. O que você quis dizer com terras agricultáveis dadas a estrangeiros ?
    Não entendi.
    Nao Li nada a respeito
    Pode me responder no meu WhatsApp pessoal porque no da ACLA não há condições.
    Obrigada

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  2. Em termos de política brasileira, aparentemente o poço é sem fundo. A cada dia uma declaração mais subterrânea, enquanto o país balança, à deriva.

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