Escrito nos livros de História

A história é contada pelos vencedores, mas com o tempo, o lado dos perdedores passa a ser conhecido. Essa é a maravilha do trabalho do Historiador, buscando em arquivos e depoimentos a integridade dos fatos pretéritos. Com a Independência do Brasil não é diferente, pois muitas versões dão conta do que realmente aconteceu naquele 7 de setembro de 1822. Ou se o determinante histórico fora exatamente aquele dia ou os acontecimentos precedentes e com outros atores políticos. Se pelo lado da precisão histórica, os detalhes compõem o verdadeiro quadro - um pouco diferente da tela de Pedro Américo no Museu do Ipiranga -, do lado contemporâneo, são os fundamentos do que veio a ser chamado de país que passam a ter valor. O Historiador, cujo dia foi comemorado em 19 de agosto, se ocupa também desse mister. Mas foi bonito ver o povo indo aos desfiles em ato cívico com as autoridades que compõem os poderes constituídos do país. Infelizmente há os que não entendem a diferença entre democracia e golpismo, ou entre patriotismo e patriotadas, e até o governador foi participar de ato esvaziado em defesa de criminosos. Vá entender!

Pelo menos, muito mais gente do que os defensores de vândalos esteve na Bienal do Livro de São Paulo, no final de semana do mesmo feriado. A logística não deu conta de colocar dois eventos de grande público - a Bienal e o desfile - em locais próximos numa metrópole que já não possui espaço nem para o ar que supostamente se respira. O evento da patriotada era mais longe e não atrapalhou o trânsito, ainda que provocando mortes cívicas, em total desconstrução com a realidade. Por outro lado, fiquei sabendo de muita desorganização na Bienal, falta de informações, exploração nos preços de alimentos, filas enormes para entrar, ver, comprar, ir ao banheiro, mas o público atendeu em massa para estar junto aos livros e, principalmente, a seus autores e autoras. É o momento em que a obra ainda não está imortalizada por serem vivos os que a escreveram. Um autógrafo aqui, uma tietagem ali, uma foto acolá e vamos cumprindo o ritual de participar do evento. O intelecto superando a ignorância, ao menos em números, é um alento.

A importância do estudo da História é fundamental para evitar as cenas lastimáveis que ainda continuam a invadir as ruas. O dia-a-dia do poder e a movimentação das massas são matéria-prima para as obras que profundamente estudam nosso tempo. Tento acompanhar os lançamentos, mas parte da atualização fica apenas em resenhas e artigos comentados, pois se até o tempo cósmico é finito, o que dirá o meu. Um exemplo é Surazo - Hans e Monika Ertl - Uma História Alemã na Bolívia (ed. Mundaréu), em que a autora austríaca Karin Harrasser conta a saga da família Ertl, de origem nazista, que passa pela vingança da morte de Che Guevara. A historiadora e jornalista Sylvia Colombo, ao resenhar o livro lançado este ano no Brasil, mostra o quão pouco sabemos da história da América Latina, fruto de anos de deseducação de nossos governos militares. Um livro que já está na lista dos imprescindíveis para ser lido. Vai na mesma linha de outro apresentado neste espaço: Bavária Tropical, de Betina Anton (https://adilson3paragrafos.blogspot.com/2024/01/a-culpa-e-das-palavras.html), que também traz a vida de um nazista para bem perto de nós.

Comentários

  1. Ainda bem que mais gente procurou livros. Ainda assim, é de se lamentar a ignorância e a desinformação que pululam nesse patropi!

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  2. Participei algumas vezes da Bienal.
    Nesta Bienal 2024, nossa querida trovadora- escritora de livros infantis Katia Santinaro esteve apresentando seus livros.
    O que chateia na Bienal é a abordagem de editoras de revista e jornais, canal na internet, agência de viagem que nos brinda com alguma coisa e cadastra nossos dados e depois ficam o ano todo nos enviando proposta de vendas de seus produtos.
    Sarah Passarela

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  3. Muito bom artigo, Adilson. Gostei de ler: mostra que nem tudo está perdido, a despeito do parco conhecimento de nossa história, pois ainda assim, nossa Bienal dos Livros fica lotada, o que prova que há uma sede de saber por parte de uma população que tendemos a imaginar como pouco interessada em ler livros.

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  4. Ótimo artigo, Adilson! Comecei a ler e me lembrei de um ditado africano que diz mais ou menos isso: "Enquanto o leão não aprender a escrever, a história será escrita pelo caçador". Acredito que poderia ser uma epígrafe para o que você escreveu, enfatizando a importância da educação, tão negligenciada em nosso país. Sem educação de qualidade estamos expostos à demagogia e às ameaças à democracia.

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  5. O livro 1822 de Laurentino Gomes traz o cenário do Brasil na época da suposta "independência" e clareia nossa mente, contrariando o que nos foi apresentado nos livros escolares de antigamente.

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