Flor literária
A professora é vice-reitora e nem por isso tem o completo domínio da fala, da retórica, para cativar a audiência. Ela fala mal. Travada para ler a nominata, com aqueles títulos e instituições todos, disse que um professor é da universidade A enquanto ele é da B e, no meio de profissionais e especialistas em bioenergia, afirmou que a agência é do "gás nacional", sendo que é em gás natural que todos ali estavam interessados. Nacional também pode ser, mas a natureza geológica do produto supera a geográfica. O plural também lhe é difícil - que dor nos ouvidos. Os "bios produtos" entram no lugar de bioprodutos, sem dar azo a um preconceito linguístico de minha parte, apenas se esperava mais da alta dignidade acadêmica. Nervosa? Talvez. Quem sabe a norma culta deve cultivá-la e saber que há outras formas de falar e nunca, nunca se impor. O "errado" de ontem é o "certo" de hoje. A fala é um cartão de visitas, no tempo em que havia cartões e visitas eram feitas. A última flor do Lácio é o que nos une e, em grande parte, nos define como povo. Cultivemos esse jardim, portanto. Na universidade aprendemos a ser pragmáticos, mas deveríamos sê-lo sem perder a poesia das palavras.
O final de semana passado foi abrilhantado com a Festa Literária Lorenense (FLLOR), naquela simpática cidade valeparaibana. Sou um dos fundadores da Academia de Letras de Lorena (ALL), da qual já fui presidente, e membro do Instituto de Estudos Valeparaibanos (IEV), duas entidades que foram responsáveis pela programação literária da FLLOR. Pude estar em mesas de discussão no sábado e no domingo e aprendi muito com historiadores, escritores, músicos e atores culturais. Não surpreendeu que os principais inspiradores dos compositores são Fernando Pessoa, Clarice Lispector, Chico Buarque e autores hispânicos. Eles me mostraram que a canção é elaborada com todos os sentimentos, até as experiências esotéricas de cada uma. Letra e melodia têm vida independente e com distintos tempos e espaços, que, por vezes, se encontram. Quanto à história, devemos enaltecer nossa aldeia para o mundo e falamos de Euclydes da Cunha, o escritor que viveu dois anos em Lorena e é o patrono de nossa ALL. Dentre os vários frutos, ao final do evento foi proposto criar um Grupo de Estudos Euclydes da Cunha ao qual ingressei de imediato. E sugiro o epíteto "euclidianos lorenenses".
Cravo é uma flor. Ele nem sempre briga com a rosa, que ouve queixas e não fala, aprendemos com Cartola. No embalo dos 50 anos da Revolução dos Cravos e no recente e inconfidente 21 de Abril do lado de cá do Atlântico, haverá sarau de poesia na Biblioteca Municipal de Campinas no sábado, 27, a partir das 10h. Ouvir que foi bonita a festa, em tanto mar que há, é providencial na voz de Chico Buarque, novamente ele (https://www.youtube.com/watch?v=PZvOUN2dqgM). Ano passado juntei o fato histórico com o cantor para falar de Portugal, literatura mui bem florida (https://adilson3paragrafos.blogspot.com/2023/04/um-imenso-portugal.html). Os tempos voltam a ser bicudos e não podemos dar uma no cravo, outra na ditadura.
Parabéns por mais uma bela construção literária.
ResponderExcluirParabéns pela flor literária tão bem escrita.
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