Cinzas inférteis

A crise dos fertilizantes que afunda mais ainda o agronegócio brasileiro, paradoxalmente, trouxe o potássio à tona. Esse elemento químico metálico é abundante na crosta terrestre na forma de íons, que constituem os sais de potássio. É assim que ele é absorvido pelos seres vivos e integra vários sistemas de controle, especialmente os relacionados a equilíbrios iônicos celulares. Junto ao nitrogênio e fósforo forma a tríade mais usual de fertilizantes que são nominados pelos símbolos químicos N, P e K. O nome potássio vem de "cinzas em pote" e parece que é nisso que querem transformar a Amazônia. Pregam o pote de ouro, mas ficarão apenas as cinzas na terra. O símbolo K maiúsculo vem do latim kalium que significa exatamente isso, a potassa, um material alcalino obtido das cinzas. Faz parte da cultura secular o sabão de cinzas, por meio do qual misturam-se óleos e gorduras com cinzas que são cozidos lentamente sob o fogo. Uma reação de saponificação (nome pouco criativo, por certo) transforma os ácidos graxos - ou gordos, como se fala em Portugal - nos sais desses ácidos com poder dúbio ou anfótero, interagindo com substâncias não polares (as gorduras) e polares, a água em especial. Um produto simples excelente para limpeza.

O K maiúsculo assim se escreve por convenção, pois todos os elementos químicos são escritos com maiúsculas e se houver uma segunda letra ela será sempre minúscula. Nitrogênio é N, fósforo é P (do grego phosphorus, portador de luz), ferro é Fe, cálcio é Ca. Alguma diferenciação é necessária porque o k minúsculo é reservado para o prefixo indicador de mil vezes. Assim, km significa mil vezes o m, e m significa metro (sim, todas em minúsculas). Da mesma forma que kg serão mil gramas, kh serão mil horas, kW serão mil watts. Ah, mas agora usou um W maiúsculo! Apenas porque é nome de gente. Na física o K maiúsculo em homenagem a Kelvin expressa a unidade de temperatura absoluta que é semelhante ao Célsius, outro homenageado com o C maiúsculo. A única exceção é usar L maiúsculo ou minúsculo para litro por uma questão histórica de limitação gráfica, quando o l minúsculo era confundido com o algarismo 1. Em máquinas de escrever, reparem bem, não existe o número 1, pois usa-se a letra l (ele) com essa finalidade, economizando-se um dispositivo mecânico. Zero também é substituído pelo O maiúsculo. Assim é que está em minha Olivetti ainda em uso. 

Pode ser nebuloso ou cinzento esse mundo de regras para a nomenclatura científica, mas faz parte de convenções com a intenção de ser uma linguagem universal utilizada em qualquer idioma, mesmo com alfabetos distintos. Em um texto em japonês, chinês ou árabe, essas notações serão sempre as mesmas. Da mesma forma que convencionou-se usar letras maiúsculas para nomes de pessoas. Certo que e.e. cummings se assinava em minúsculas, mas não é o usual. Muito da nomenclatura científica vem do alemão. Daí k ou K também se referirem a constantes (em alemão Konstante); por exemplo, uma constante de velocidade de reação k, ou uma constante de equilíbrio K. Nem adentramos a matemática que emprega na álgebra façanhas lítero-numéricas para explicar até o que não existe. Faltam letras para tantas definições e inserções no conhecimento das ciências naturais. Falar um pouco sobre seus usos ameniza a infertilidade do pensamento retrógrafo e anticientífico em que vivemos.

Comentários

  1. Gostei muito desta edição de seu blog! Ofereceu minúcias químicas a nivel do entendimento dos leigos.NPK a formula de ouro na agricultura.

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  2. Muito didático. Bons ensinamentos.

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