Repetindo o aprendizado
No rememorar de vivências e convivências, lembrei-me de um gerente de uma importante indústria química com o qual tive contato por um bom tempo para desenvolver projetos conjuntos de pesquisa científica. Fizemos um treinamento para escolher estudantes de engenharia que trabalhariam conosco. Num desses encontros, ele discorreu sobre a necessidade de aprimoramento e mudança de abordagens frente a inovações e novos desafios que se apresentam, pois o risco de ficar obsoleto - tanto o processo quanto a pessoa - é muito grande. Falou que começou a trabalhar em um escritório e lá aprendeu a tirar cópias xerox. Com o tempo, ficou craque na tarefa e ninguém tirava cópias melhor do que ele. Sabia ajustar as dimensões para ampliações e reduções, posicionava corretamente os originais, serviço perfeito. E depois disse que aquela prática nada mais valia: não se tiram mais xerox. Na época dei crédito às considerações, mas hoje entendo a questão de forma diferente. Aquela experiência foi importante para moldar sua responsabilidade e a busca pela excelência em outras áreas. A técnica foi usada para a perfeição, não para um objeto específico de trabalho.
Outras semelhanças vêm à mente. No clássico filme dos anos 1980 Karatê Kid (detalhes aqui: https://www.imdb.com/title/tt0087538/), o senhor Miyagi faz o treinamento do jovem protagonista forçando-o a lixar e pintar paredes para que desenvolva as habilidades de movimentação, de ataque e de defesa com braços e mãos. Repetição para alcançar a excelência, não apenas pela prática, mas pela concentração. Meu professor de matemática do ensino médio (mentira, era segundo grau na época, integrado com o curso técnico) cuidava para que, em cada tópico abordado, ficasse clara a relação com assuntos seguintes. Chegamos em limites - sim, eu estudei isso - e o tema parecia sem sentido, havendo muitos e muitos exercícios para serem resolvidos de forma repetitiva e maçante. O professor se preocupou em informar que limites era a base para estudar derivadas e integrais, assuntos que somente na universidade veríamos. Dito e feito. Aqueles exercícios me valeram alguns pontos na primeira avaliação na Unicamp e pude ser aprovado no famigerado curso de Cálculo. São exemplos para responder àquele aluno que pergunta: para quê aprender isso? Nunca vou usar...
O utilitarismo da educação é nocivo por limitar a capacidade criativa e destinar a aprendizagem apenas para aquilo que se considera aplicável. Lembremos que o útil é dependente do tempo e do espaço, enquanto os mecanismos cerebrais estimulados poderão ser usados sempre e em qualquer lugar. Em um dia de trabalho tenso no qual nada de produtivo foi feito, para combater o estresse e a frustração, pus-me a desenhar um pentágono numa folha de papel e passar a calcular todas as relações trigonométricas nele existentes. Qualquer livro de geometria mostra as fórmulas já deduzidas, mas quis fazer eu mesmo como se fosse um filósofo de milênios atrás. Aquilo exercitou positivamente partes da mente que estavam em conflito com a tensão do dia e me acalmou. O conhecimento dali advindo foi semelhante à prática de tirar xerox do colega da indústria química, pouco servindo de forma imediata para o que viria a seguir. Mas foi o estímulo que propiciou aprendizado. Com a devida vênia aos colegas pedagogos, este relato é pessoal e não testei hipóteses científicas que fundamentem minhas conclusões. #IniCiencias
Eu , com minha experiência de educadora por 27 anos tenho a dizer duas coisas:
ResponderExcluirA repetição reforça o aprendizado.
É assim na música, na pintura, na escrita.
Pode- se muito bem abrir chances para a criatividade e reforçar a repetição.
Segunda coisa: como pessoa, o que aprendi por repetição na infância e adolescência- como musicas, poemas enormes, verbos em latim e enunciados de verbos em
Inglês e francês- sei até hoje.
Estimular os mecanismos cerebrais é muito importante para a aprendizagem . A repetição é importante ,inclusive para aprimorar o que foi aprendido.
ResponderExcluirAinda sei de cor o Discurso que fiz como Oradora da turma, no quarto ano primário e, baseando neste discurso de minha infância, escrevi muitos outros discursos para várias situações diferentes.
Magda Helena
Muito interessante e verdadeira esta correlação entre o "aprender, fazer repetidas vezes, atingir a perfeição", que mais cedo ou mais tarde serão úteis mesmo em um outro segmento. Uma ótima maneira para responder e explicar aquém faz aquela famosa pergunta: Porque que tenho que estudar, aprender se nunca vou usar. Este nunca não existe.
ResponderExcluirParabéns pelos excelentes parágrafos!
Meu marido diz, em seus treinamentos de gestão empresarial, que nós temos que aprender a aprender. Eu digo que não importa o que estamos aprendendo no momento, mas se estamos aprendendo com excelência. Assim, como você diz, algo que, num determinado momento, pode parecer sem qualquer importância, no futuro pode se mostrar de grande valia para nos ajudar a desempenhar com competência uma tarefa considerada mais desafiadora.
ResponderExcluirAparecida M. Kugelmeier
Que se vem fazer neste mundo? Aprender! O resto é consequência.
ResponderExcluirA questão da aprendizagem me leva, como educadora, ao ato de ensinar. À luz da Semiótica, uma pergunta que sempre me fiz foi: " O que estou realmente a ensinar quando ensino o que quero ensinar?" - Lixar paredes e pintá-las, não estão ensinando o fato em si, mas o desenvolvimento do corpo contido naquela ação. Parabéns pelo texto reflexivo.
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