Saberes reflexivos
Minha irmã gêmea de Academia Campinense de Letras, Maria Cristina de Oliveira, disse que os textos do blog estão ficando mais reflexivos e filosóficos. A filosofia é-me disciplina estranha, por pouco contato que pude ter com ela em meus anos de formação, nos quais grassava a ditatura militar que nos ocultou quase todos os saberes das Humanidades, além dos corpos assassinados em porões. O pouco que passei a saber na época do colégio foi devido ao Orestes, militante revolucionário, que conseguia subverter a ordem e nos apresentar e ofertar os livros da coleção Primeiros Passos ("O que é...") para leitura. Reflexão, sim, creio que é uma constante na lavra do escritor, uma vez que é de si que ele fala ao mundo, mesmo quando é ficção - tanto o eu quanto o mundo retratado. Se há pouco mundo interno ou externo nesse retrato, tornará o escrito retraído, não retratado. A Maria Cristina esbanja gentileza nos comentários, tanto quanto esbanja talento em seus escritos, a começar pelo próprio blog que possui (https://mkolliver.blogspot.com/).
A constância de saber e conhecer move-nos. Fundamental é estudar o conhecimento, como dizia Ruth Guimarães, a madrinha da Academia de Letras de Lorena. No dia de Santo Antônio é aniversário dela, nascida em 1920. Resgatei uma crônica que escrevi em sua homenagem (Dona Ruth), ganhadora do Prêmio Monteiro Lobato de 2016 e publicada em coletânea pela editora Almanaque Urupês. Revisitando o texto, como sói acontecer, vemos que ao longo de uma década, o entendimento junto às palavras vai se alterando. E passamos a compreender melhor o lugar de fala dos outros. Lá no texto eu afirmei que dona Ruth havia me dito que eu era um poeta que acabou se travestindo de químico para viver. Com certeza não foi essa palavra inadequada usada por ela, apenas resgatei a imagem de sua fala. Resgatei bem, mas registrei mal. Aprendemos que a inclusão e respeito às pessoas transgênero perpassa o entendimento de que é inadequado usar uma palavra como travestir no lugar de disfarçar. Isso devido à conotação depreciativa do termo. Lá, na crônica, creio que não foi com esse tom, mas hoje eu não escreveria assim. Diria diretamente disfarçando, que dá a ideia do que dona Ruth me disse - e me enalteceu com a memória daquela conversa - sem precisar usar o termo vetado. Sim, não vou reescrever o texto ou cancelá-lo como querem fazer com muitos autores que pisaram na bola em suas convicções e escolhas. Para os escritores que também somos, é mais honesto reconhecer a força da palavra e explicar que há inúmeras formas de dizer a mesma coisa sem ser ofensivo ou desrespeitoso.
O Saberes poderia ser música de Caetano Veloso como é O Quereres. Onde sabes os sabores, sei os suores. Algo assim poderia ser o início de uma doce composição - ou paródia - dos sábios lábios à bruta busca de saciar os desejos da mente e da pele. O maior órgão do corpo humano, a pele, é o que mais sente, e a mente, o mais recluso, é o órgão dos sentimentos. Amor, sim, também vai aí incluído, o mais complexo e necessário dos sentimentos. O brasileiro resolveu colocar um dia para os namorados no início do inverno, só por coincidência um dia antes do dedicado ao santo casamenteiro, aquele do aniversário de Ruth Guimarães. Entendo que o frio dos pés é melhor acalorado por cobertas e cobertores de orelhas, aquelas pelas quais passam-se dedos, narizes e tudo mais o que Eros permite. Compartilhar canecas de chá e chocolate quente completa o quadro primoroso. Café não conto, pois é líquido vital do dia-a-dia. Fugimos da data para os namorados de fevereiro, de todos os outros países, já fartamente dedicado ao carnaval, ainda que neste ano a festa caiu em março. Amor é, assim, outro saber, sempre reflexivo e em contínua construção.
Excelente reflexão
ResponderExcluirDr. Adilson, seus parágrafos nos enriquecem sempre e deles ficamos milionários, visto que não os perdemos. Plenos de evocações e relatos variados, eles nos oferecem profundidade, verdade e sinceridade.
ResponderExcluirAdilson, gosto de ler suas reflexões! Ajudam me pensar!
ResponderExcluirAdilson, o seu blog está repleto de ricas passagens vividas por você.
ResponderExcluirNomes que deveriam permanecer em evidência,
a gora são trazidos por você ,com admiração e respeito.
O dia dos namorados foi descrito com muito carinho e cheio de detalhes!
Parabéns! 🎈
O comentário acima é meu, Cidinha
ExcluirSenti-me lisonjeadíssima pela deferência ao meu nome e ao meu blog que não anda sendo atualizado, devido a questões que postarei oportunamente. Muito obrigada meu irmão gêmeo! Quanto ao texto desta semana, concordo plenamente que o entendimento das palavras vai se mudando com o passar do tempo e o jeito de ler, escrever e interpretar as coisas dependem de como estamos e de como somos em determinados momentos da vida. Eu já escrevi algumas coisas que hoje eu não escreveria da mesma forma ou não as escreveria. Essas reflexões que nos fazem amadurecer e nos tornarmos diferentes quanto a escrita e nos moldando como literatos.
ResponderExcluirNo fim, prezado blogueiro, o que sobra da salada da vida é filosofia e arte. (PSViana)
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