Linda festa, vamos trabalhar

Foi bonita a festa. Emocionamo-nos todos os que por ela ansiavam, mas sabemos que ela é apenas um marco e que o trabalho duro vem agora. Muito trabalho, por sinal, como já estamos sentindo por tudo o que é necessário reconstruir. Movimentos políticos e administrativos estão em curso, mas sabemos também que há períodos iniciais de quase inércia, quase como ritos de iniciação, que precisam ser respeitados. O Brasil só começa depois do carnaval é um deles e outro é aguardar os 100 primeiros dias como licença para ajustar rumos e rotas. Estou testando os espaços jornalísticos para medir a temperatura de aceitação do novo tempo e parece que há ainda muito receio, frustração e cobranças antecipadas. Novo tempo, sim, mas sem baixar a cabeça e ignorar crimes pretéritos com a intenção de apaziguar ânimos belicosos remanescentes de mais um período de trevas escrito em nossa conturbada História. Colocar o povo novamente como protagonista de um país não é tarefa fácil.

Festas feitas, festas lidas. Ler é viver e dá trabalho se atualizar em um mundo cada vez mais complexo e de múltiplas versões. Nunca antes a própria realidade passou a ter matizes que contradizem sua própria existência. Se antes leituras lineares eram suficientes para compreender minha natureza por meio da natureza expressa pelo escritor, hoje tenho de compor meu próprio relato dos fatos. Bom ou ruim, não sei, mas é inegável que tudo exige mais leitura. Como complemento, copiei do Facebook essas linhas, postadas por mim há nove anos: Hoje é dia do leitor. Comemoremos lendo um texto, um conto, um poema, um artigo, um livro, um desejo, uma emoção, uma aventura, uma história. A leitura nos faz seres humanos e por meio dela podemos entender e transformar o mundo. E não é frase retórica de efeito para preencher facebook, porque não sou disso. Vivência própria de quem muito leu e lê e ousa escrever um pouco. Lemos menos porque vendem-se poucos livros? Sim, talvez, pode ser. Mas enalteçamos a leitura, o deleite de conhecer a si mesmo e a outros eus, tantos os nossos como dos outros.

A biografia de Angela Maria, escrita por Rodrigo Faour, segue seu curso, sem a mesma empolgação dos especialistas nesse tipo de literatura. Acostamado que fui com Ruy Castro e Lira Neto, o ritmo de Faour parece uma colagem de reportagens jornalísticas, com inoportunas interferências coloquiais do narrador, sem destacar o pitoresco para aborrecer com o óbvio. A de Fernando Pessoa, escrita por Richard Zenith, acabou de chegar e ainda está no processo de cheirar, folhear, tatear, ler capas e contra-capas. O planejamento para adentrar a fila de janeiro é confuso e não linear. Mas vai ser lida. Migrando para outra leitura bem distinta, já estou envolvido com "A mandíbula de Caim", de Torquemada, pseudônimo do compilador de palavras cruzadas Edward Powys Mathers. Em tempo: os dois biógrafos brasileiros citados - os da melhor qualidade - lançaram obras para, digamos, explicar como fazer boas biografias, boas contações da história dos outros. Assim, a lista de 2023 só aumenta depois da festa. Em férias, é tempo de trabalhar a mente.

Comentários

  1. A festa foi bonita, pode ser. Mas o que anda precisando de boniteza é o nosso Brasil. Vamos esperar para ver. Enquanto isso, vamos ler bons livros. (P.S.Viana)

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  2. A festa foi bonita. Mas nem pudemos curtir a sensação de alívio e já fomos novamente jogados às trevas! Pobre Brasil!
    Quanto à leitura, não conheço nada melhora para instigar o espírito.

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