Vida dourada

As chuvas de quase verão são intensas, deslocadas no tempo e no espaço, mas totalmente previsíveis. Os danos urbanos acontecem como se inesperados fossem, galhos caem e a primeira atitude é retirar mais ainda as parcas árvores existentes. Precisamos de mais vida e não de mais morte. Onde moro, os condomínios invadem as áreas antes destinadas a fazendas, com impermeabilização de solo sem qualquer compensação ou alternativas para o que fazer com a água que continua encontrando seu espaço. Leis que regulamentam o uso do solo são fruto da economia, não da lógica ambiental. Ainda que o mundo político esteja novamente de volta (https://www.brasil247.com/blog/mundo-politico-de-volta), a lei da selva de pedra do mais forte monetariamente é a vigente. A especulação imobiliária sempre falou mais alto, pois o que lucra com a valorização de transformar um terreno em edifício não mora naquele lugar, deixando o caos do trânsito e falta de urbanidade para os que creem estarem investimento no patrimônio. Isso não é vida! 

Tudo tem um preço, ainda que o valor seja algo subjetivo, mais conhecido quando esse tudo falta. A carne está a preço de ouro há muito tempo. A metáfora foi transformada em linguagem direta ao usarem o vil metal como elemento de decoração do alimento. Tal artifício gourmet é antigo e desnecessário, bem o sabemos, e meu sensível estômago, tratado com "prazois", fica sensível em pensar que uma substância áurea fosse assim usada, passando pelo trato gastroinstestinal. A inércia do ouro torna-o quimicamente bem pouco interessante, uma vez que estudamos as transformações, não a permanência. Inércia química é contrária à vida. Por outro lado, a combinação de estabilidade com o brilho peculiar tornou o ouro um símbolo de riqueza e cobiça. Até Lima Barreto resgatou a história alquímica de transformar ossos no metal, relatado em seu conto "A Nova Califórnia". Tudo pode virar ouro de tolo, expressão relacionada à pirita, um mineral formado por sulfeto de ferro, que possui um brilho dourado semelhante às pepitas de ouro. Mas não é. Assim, resta-nos refletir sobre a expressão que diz que nem tudo o que reluz é ouro.

No entanto, a representação remuneratória dos metais é uma riqueza fictícia, mas que precisa ser tornada real, como a necessária para não deixar morrer por sufocamente a ciência, a educação e tantas outras áreas sociais. Nesta semana, os bolsistas da agência de fomento federal CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) foram surpreendidos com a falta de depósito mensal. São mais de 200 mil estudantes de pós-graduação, principalmente, que deixarão de cumprir com suas obrigações correntes, como pagamento de aluguel, transporte, alimentação, pois é a única fonte de recurso que possuem. A imprensa tem noticiado mais essa tragédia governamental, mas não informa que o bolsista não pode ter outra fonte de renda, devendo se dedicar única e exclusivamente às atividades de pesquisa. E também omitem que mais de 80% da pesquisa científica e intelectual do país é feita na universidade pública, majoritariamente por esses bolsistas. Também o músico, estudante da Unicamp, que dá um recital gratuito no fim de semana em entidade cultural, é outro desses bolsistas. Hipocrisia defender o desgoverno que abondona o país e aplaudir o pianista, querendo viver a ilusão de uma vida dourada.

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