Só há morte na vida

"Só há morte na vida". A frase tem seu costumeiro duplo sentido, que a morte naturalmente seja determinada pela vida ou que seja o lamento de nada mais se encontrar na vida além da morte. Dubiedade proposital para rechear a crônica, confessando que foi constatada depois que a frase estava pronta. O complemento pelo primeiro significado seria dizer que, sem vida, não há morte. Tudo o que morre precisa estar vivo, por óbvio. Da segunda interpretação mantenho distância, pois, por pior que a vida seja, tal qual a música, ninguém quer a morte. De sorte que sigamos na rima e na sina de viver. Dias ruins já vivemos e os deixamos para trás, pois a esperança nos diz que a melhora se descortina no horizonte. E quanta vida vista nesses dias em que o Brasil recuperou o protagonismo internacional, apresentando compromissos e propostas! Volta-nos o orgulho de sermos um povo. Sim, há os discordantes, minorias tresloucadas espalhadas por cantos e canteiros, mas não muito distinta dos cânceres sociais com que convivemos por tanto tempo e os temos vencido, sem disparar um tiro.

Os ciclos metabólicos transferem matéria e energia. Isso é vida no melhor entendimento científico que possuímos. Nele não nos limitamos, é claro, para que poesia possa ali adentrar e, inexplicavelmente, tornar tudo mais suportável. Ah, arte&cultura que nos retornam em breve! Ainda que clamemos por um pouco de lógica na materialidade das palavras, temos de conviver com disparates sobre os acontecimentos recentes no país e no mundo. Com solavancos, entendemos que há grupos fortes que se alimentam da mentira para a sobrevivência, superando mimetismos naturais desenvolvidos na evolução. No âmbito das ciências sociais modernas, o documentário Democracia manipulada é obrigatório e disponível no canal Curta, pela tv por assinatura ou pelo site. Ali entendemos um pouco mais sobre construções ficcionais, como a que foi imaginada no filme Mera coincidência (Wag the dog, no original, de 1997), dirigido por Barry Levinson (https://www.imdb.com/title/tt0120885/), cujo enredo é a produção de uma guerra na Albânia para esconder escândalos sexuais de um candidato à presidência. A interpretação de Dustin Hoffman e Robert De Niro, dentre outros, é magistral. A semelhança com as ficções - ou narrativas - criadas por extremistas de hoje segue a linha da arte imitando a vida.

Morreu José Saramago em 2010, cujo centenário de nascimento se dá neste 16 de novembro. Também morreu Lima Barreto, há exatos 100 anos, no primeiro de novembro, véspera de Finados. Coincidências, apenas, já reveladas aqui por serem poucos os dias em um ano para acomodar tantas efemérides. Falo do centenário do triste visionário Lima Barreto em palestra virtual na Academia de Letras de Lorena, no próximo sábado, que deverá ser continuada na semana seguinte na instituição análoga em Campinas. Os links estarão no Facebook, ainda que tendo acesso limitado às apresentações (https://www.facebook.com/adilson.goncalves.9847/). Um dos argumentos que pretendo levar à reflexão é que Lima Barreto foi mais uma vez esquecido por serem tantos os centenários comemorados neste 2022 (http://adilson3paragrafos.blogspot.com/2022/11/lima-barreto-novas-tristezas.html). Lembranças que ofuscam. Sem querer transformar o blog em necrológio, é necessário também lamentar a morte da ex-jogadora de vôlei e ativista Isabel Salgado. Muita vida que ainda seria vivida.

Comentários

  1. Olá, Adilson, desta vez resolvei ler sua crônica. Um comentários:
    >Os ciclos metabólicos transferem matéria e energia. Isso é vida no melhor entendimento científico que possuímos.
    Com o método cientifico atual jamais vamos saber o que é a vida, e muito menos a diferença entre plantas, animais e seres humanos (que eu jamais chamo de animais racionais; seres humanos são seres humanos e animais são animais -- as diferenças são grandes demais para dizer que a única diferença é a racionalidade). Pode escrever aí: e jamais saberemos o que é o pensamento, o sentimento e a vontade, a memória, bem como o sono, o sonho e, porque não, a morte. Ah, e jamais saberemos qual é o código que o cérebro usa, e aqui eu tenho uma conjectura fortíssima: esse código não existe, de modo que o transhumanismo é balela.
    Para começar, veja meu artigo
    https://www.ime.usp.br/~vwsetzer/conceito-cerebro.pdf
    aaaaaaaaaaa,
    www.ime.usp.br/~vwsetzer

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