Lima Barreto, novas tristezas

Cem anos da morte de Lima Barreto em 1 de novembro de 2022. A proximidade da data com outros eventos, em especial as eleições, deixou pouco espaço para as devidas lembranças e reflexões. A teimosia de Lima em escrever sua negritude suburbana é resgatada nos movimentos sociais de hoje, ainda que sem a devida autoria ou inspiração. Foi crítico do sistema político, dos acordos explícitos e implícitos para negociar privilégios, e da sociedade que julgava o negro a priori, qualquer a situação. Pouco mudou no século que se passou, bem o sabemos. Triste visionário, esse Lima. Por pura sorte sua obra e biografia foi resgatada por Francisco de Assis Barbosa a partir de 1952 que nos revelou um Lima Barreto além dos romances "Triste fim de Policarpo Quaresma", "Clara dos Anjos" e "Recordações do escrivão Isaías Caminha". Sua crônica intensa e ininterrupta na imprensa da época foi feita em grande parte sob pseudônimo, o que nos criou um obstáculo a mais para descobri-lo. Muito ainda está inédito, tal como tenho noticiado neste espaço. A efeméride leva-me a rever a questão e compor uma apresentação neste mês para as Academias Culturais a que pertenço.

Acontecimentos se consolidam e fico triste pelo colega de trabalho, servidor, que defendeu o exterminador do serviço público, como se possível fosse a privatização da sociedade. Triste por ele ter me indicado o site progressista Brasil 247 em que consigo publicar boa parte de minhas reflexões e, mesmo ele tendo sofrido reveses pessoais, como a morte da esposa por um câncer severo, não entendeu que outras tantas mortes aconteceram devido à inépcia do governante que também reduziu sobremaneira os recursos para a saúde, tratamento de câncer aí incluído. Triste pela ex-aluna premiada, contemplada com a possibilidade de estudar em universidade pública de excelência, mas que entendeu que tudo foi exclusividade de seu mérito pessoal e não aceita que outros indivíduos de outras trajetórias viveram tragédias distintas. Triste porque sua crença religiosa foi superada pela crença no que o pastor lhe diz e envia pelos diabólicos grupos virtuais. Triste por ela ter presenciado o lançamento de programas de internacionalização da atividade acadêmica e desprezado todas as iniciativas de inclusão social.

No meu entorno mais próximo de familiares e amigos houve vários contaminados pela covid-19, mas ninguém faleceu. Mas fico triste pela tia que morreu durante a pandemia, muito provavelmente pelo coronavírus. A tristeza aumenta ao saber que a prima, professora, defendeu o exterminador da educação e da saúde, restando a dúvida se a mãe dela morreu porque não foi vacinada, seguindo os ditames negacionistas do mentor-mor. São tristezas, novas e antigas, que restam como alertas. Voltando à tristeza de Lima Barreto, que é ditada tanto pela intensidade real de seus escritos, quanto pelas dificuldades pessoais pelas quais passou, ela serviu a Lilia Moritz Schwarcz de epíteto para a mais recente biografia do autor, de 2017 (Lima Barreto: triste visionário, Companhia das Letras). Que ele nos inspire. Para diminuir o tom pessimista dos parágrafos, apesar de tantas tristezas, próprias e alheias, a esperança está renovada, sem medo de ser feliz.

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