Vou contar um causo

Contar um 'causo' é atividade cultural de raiz que ainda acontece. A origem é supostamente caipira, com enredos envolvendo tipicamente (mas não apenas) situações em lugares ermos com aparições, assombrações e outros elementos de nosso rico folclore. O bom causo não precisa ter enredo bem construído, mas precisa ser contado com dramaticidade, detalhamento e uma conclusão ímpar. Ou seja, é uma mentira muito bem contada. Em conversas de amigos, quando ainda se reuniam em mesas de botecos, bazófias eram comuns, perdendo um pouco do charme de um causo e com ambientações urbanas. Falar de situações vividas em assaltos ou no trânsito substitui os encontros com a caipora, a mula-sem-cabeça e fantasmas. Os interlocutores sabem que são construções do imaginário e jamais pensariam em transformar o contador do causo - ou quem estivesse a ele pagando para desempenhar tal papel - em um líder político. Bem, com o advento da internet isso passou a ser corrente e acreditar na versão passou a ser mais importante do que se certificar do fato. Sem o charme cultural.

O show de horrores da reunião ministerial revelado semana passada foi substituído pela prática do terror anti-democrático, quando as narrativas são as mais diversas possíveis, agradando ao mandatário quando as ações investigativas são contra adversários, irritando-o quando a mesma atividade republicana revela o mecanismo engendrado para disparar mentiras e fake news para lhe sustentar o governo. Atribuía-se como ingênuo o caipira que acreditava no saci, mas canta-se de galo ao replicar as mais estapafúrdias informações, desde que o coronavírus foi fabricado pelos chineses até as que rotulam politicamente opositores sem qualquer embasamento histórico, filosófico e científico. Contam-se causos sem graça, portanto, mas com público eletrônico fiel, retrógrado e mentalmente limitado.

Esta seria a última semana de quarentena, mas a verificar os dados verdadeiros do contágio e proliferação da Covid-19 e que o isolamento social ainda está muito abaixo do mínimo necessário para o retorno de algumas atividades, creio que o laboratório ficará fechado por mais algumas semanas. Uma semana profícua, com publicação de artigos de opinião sobre a cloroquina (https://www.jcnet.com.br/opiniao/articulistas/2020/05/724973-cloroquina-e-dengue.html) e o início de reflexões que talvez componham um estudo que fiz sobre a questão do "erro grosseiro", presente em medida provisória que - tal como inúmeras outras - não deve se efetivar (http://port.pravda.ru/news/russa/28-05-2020/50683-erro_grosseiro_politica-0/). Novamente utilizei-me do inusitado site do Jornal Pravda para tal publicação. O artigo foi enviado também ao Correio Popular, jornal de Campinas, mas a fila ali está muito comprida. Esses são artigos de opinião, longe da fantasia, assim espero.

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